quinta-feira, 9 de abril de 2009

A equipa do subúrbio

de Marta Spínola

A equipa do subúrbio entra pelas 9h. Mais coisa menos coisa.
Chegam de sacos, saquinhos, almoços e um livro aqui e ali. Entram no piso como em campo, e dirigem-se às suas posições, espalhando-se pelos lugares.
Primeiro exercício do dia: comentar a limpeza de quem acabou de sair. Tudo está imundo, não se percebe que vêm cá fazer. A frase mais ouvida: “Passou um vendaval na minha secretária ou quê?”. É um lance diariamente estudado.
Alinham-se e equipam-se para o resto do aquecimento.
- Trouxeste a manteiga? Vou andando.
- Está lá dentro. Quem ficou de trazer o pão?
- A Sandra. Está a chegar.
Pequeno-almoço em conjunto polvilhado de segredos de alcova… dos outros preferencialmente. Tostas, manteigas e doces light, que há dietas colectivas no início de todos os anos. De vez em quando, cereais e leite. Depois do primeiro trimestre pão saloio e bolos.
Seguem-se o que parecem ser exercícios de vocalização pelo tom em que falam. Há disputa da atenção dos presentes, frases estudadas para captar admiração de seus pares.
Voltam a dirigir-se aos lugares e… Começa o desafio, a exibição propriamente dito.
No fim-de-semana o tempo esteve mau. Isabel levou o estendal para dentro. O tempo mudou, trouxe o estendal para fora. Cláudia esteve a lavar a casa de banho e não reparou, ficou com a roupa ensopada. 1-0 Isabel na frente. Mas, reage Cláudia, o chão num brinquinho. Há empate técnico.
O super-lava-tudo do minimercado é mais barato que o lava-quase-quase-tudo-menos-gordura-em-copos do hiper aqui ao lado, anuncia triunfante Sandra. Ana não contava com este golpe, terá de repensar o contra-ataque. E já agora de passar a ir ao mini-mercado, mesmo que issso implique mais gasolina. 0-1 Isabel e Sandra empatadas.
O Afonso – mas qual? há que distingui-los, todas têm um – está tão crescido que anda de costas e olhos fechados ao mesmo tempo sem nunca cair.. mais de 3 vezes. Isabel joga a sua arma predilecta: o rebento maravilha.
Sandra e Cláudia esmorecem um pouco, deixam-se ficar à defesa. Que é pequenino e talvez não seja boa ideia fazer isso. Há pouca convicção. No fundo querem os seus a fazer o mesmo. Prevêem-se treinos intensivos para os pequenos já a partir de logo à noite.
Isabel insiste, volta ao ataque. Já come sozinho amendoins com casca e espinhas de peixe sem nunca se engasgar. As adversárias começam a acusar cansaço, a dar-se por vencidas. Sandra denuncia-se com um grito de espanto: “A sério? Oh pá, que máximo!” 2-0, 3-0 para Isabel.
Cláudia sorri. Isabel não adivinha o movimento. Há uma primeira simulação, uma finta: “e continua sem comer a sopa?” Isabel deixa-se ficar, foi apanhada de surpresa, está parada a ver jogar. Cláudia avança: “E já dorme na cama dele?”. Empate.
Observando, Sandra anima. Alia-se a Isabel: “que mal tem dormir com a mãe? Se é pequenino e quer, que mal tem? Está só a ser boa mãe. As mães gostam de dormir com os filhos”. Cláudia fechou a defesa, dá-se por contente se conseguir manter o empate.
Isabel descontrai com a reacção de Sandra. Parece-lhe ter o jogo controlado e se empatar hoje, amanhã retomará o controlo do campeonato suburbano de troca de galhardetes. Terá tempo para se preparar para as investidas de Cláudia.
“Agora isso de andar de costas já pus no meu blog o que penso. Podes ver. Lamento, mas é a verdade”.
Isabel dribla com o link da amiga, é um momento de anti-jogo porque é inevitável ver o que está escrito. A crítica é devastadora e não há argumento de mãe que o combata. Sandra tem 3 filho e nenhum dormiu alguma vez na sua cama. Começaram a andar para a frente todos em idades diferentes e comem sopa todos os dias desde os 4 meses. Isabel poderia cilindrar tudo isto com um “mas eu gosto mais do meu”. Mas são três. E para Isabel nada bate uma mãe de mais de um filho.
Termina um dia com dois 4-3 e um 3-3 que fazem de Sandra vencedora. Amanhã novo desafio, novas abordagens e tácticas. Pode não ganhar os próximos. Mas o de hoje, ninguém lho tira.

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