quinta-feira, 30 de abril de 2009

Perfil de Vicente

Vicente tem entre vinte e trinta anos, cabelo despenteado e barba e vestuário em desalinho. Desenha muito bem e vive com o pai, escritor, em Lisboa.
A mãe deixou-os muito cedo, fazendo com que criassem uma relação forte em que trocam constantemente de posição pai e filho. Parecem ambos ter a mesma idade, sendo esta indefinida.
Vivem bem, sem problemas financeiros, numa casa cheia de luz, música e papel onde os amigos costumam aparecer.
Apesar de ser bastante terra a terra, Vicente é também muito aluado. Não tendo dupla personalidade, pode-se dizer que vive em duas velocidades diferentes.
Muito pragmático, organizado, pontual, calculista e prático – características que o ajudam muito na sua rapidez a desenhar, por conseguir captar imediatamente todos os pontos que formam as linhas de cada coisa – é também despreocupado, educado, de fácil trato, bom conversador e bem-humorado.
Acabado o curso de Belas-Artes, Vicente investe numa relação muito forte com a namorada, melhor amiga e companheira de sempre.
Um dia ela deixa-o.
Ele não percebe porquê. E começa a interessar-se pelo fenómeno da interacção social. Como nos damos uns aos outros, em que timings nos damos aos outros, porque nos damos aos outros. E porque nos deixamos uns aos outros.
A tentativa de teorização e racionalização destes fenómenos deixa-o obcecado e começa a viver uma vida de análise, de teste com os que o rodeiam. Sente-se o centro de um Universo seu em que tudo pode e deve ser justificado.
Foge para Amesterdão para começar de novo, para se perceber no mundo.
E é aqui que nada disto que o define interessa.
Porque lá ele pode ser qualquer um que decida ser.
Nada nos define para sempre.
João Madeira da Silva

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